A vulnerabilidade assusta os condutores de aplicativos. Gabriel Batista, 22 anos, dirige no sistema há um ano. O morador de Planaltina avalia que, desde o fim do ano passado, a sensação de insegurança no trabalho aumentou. Ele passou por uma situação de medo em dezembro após receber a chamada de um passageiro que faria o trajeto entre a 102 Sul e Samambaia. “Entraram dois homens no carro. Eles estavam conversando normalmente e, em seguida, colocaram bonés, cobrindo o rosto e estranhei. Como faço parte de um grupo de motoristas no WhatsApp, temos alguns códigos entre nós, que sinalizamos quando estamos em um momento de perigo. Eu digitei o número que significa sinal de alerta. Não demorou muito, e um amigo me mandou uma mensagem dizendo: ‘Oi, Gabriel, está indo para onde? Estou aqui atrás de você’. Depois disso, os dois pediram para descer do carro, muito antes do local de destino”, relatou.
Após o episódio, o jovem ficou mais atento. “Sempre deixo as travas do carro fechadas e só atendo corridas no Plano Piloto, nas asas Sul ou Norte. Infelizmente, como janeiro é um mês fraco para nós, estou aceitando dinheiro como forma de pagamento, mas costumo trabalhar apenas com cartão, para evitar qualquer incidente”, ressaltou. O também professor de educação física se deparou com a falta de oportunidades de emprego e partiu para o negócio autônomo. “Entreguei vários currículos desde quando me formei, mas está tudo muito difícil. Então, decidi recorrer ao transporte alternativo para garantir a renda”, justificou.
Marlon Ribeiro, 35, também levou um susto no fim do ano passado. Enquanto dirigia, dois jovens o renderam no P Sul, em Ceilândia. Ele recebeu o chamado de uma corrida para a QNN 20, em Ceilândia. “Os dois entraram de uma vez no carro e não teve como eu acelerar. Ameaçaram-me com uma arma e falaram que fariam um ‘corre’. Eles me obrigaram a ir a algumas casas para buscar droga. Um ficava no carro me vigiando, e o outro descia. Na hora, eu achei que morreria. Passou toda a minha vida pela cabeça”, contou.
Marlon relatou outra situação no fim de 2019. “Estava tendo uma festa na Praça do Relógio, e uma mulher solicitou a corrida para Taguatinga mesmo. Quando cheguei lá, entraram três homens no veículo. Eles estavam vendendo droga e falaram que precisavam fazer uma entrega. A polícia seguiu o meu carro, mas não chegou a abordar”, detalhou. Segundo ele, as empresas de aplicativo devem tomar providências urgentemente. “O cadastro dos passageiros deveria ser exigente, com foto, por exemplo. Antes de atender, eu sempre presto a atenção na fisionomia, que, querendo ou não, é importante, e não busco pessoas no meio da rua, porque um bandido nunca vai te chamar na porta de casa.”.
O corpo do motorista de transporte por aplicativo Maurício Cuquejo Sodré, 29 anos, será velado a partir das 8h de hoje, na Capela 4 do cemitério do Gama. O sepultamento está marcado para as 15h30. O jovem, a quarta vítima de latrocínio do sistema por aplicativo no DF, morreu na madrugada de quinta-feira, no Núcleo Rural Boa Esperança 2, na Granja do Torto. Três homens e um adolescente foram detidos pelo crime.
Segundo investigação da 2ª DP (Asa Norte), os acusados renderam a vítima depois de ela atender a um chamado por aplicativo, por volta da 1h. O condutor estava na Asa Norte, onde teria pegado um lanche a pedido do quarteto e seguiu para a Granja do Torto. Ao chegar, três suspeitos, incluindo o adolescente, entraram no veículo armados com facas. A vítima levou facadas na parte de trás da cabeça, no pescoço, na face, na mão e no braço. Depois, foi deixado em um buraco da área rural, a poucos metros de distância do veículo dele, um Logan branco.
Os homens envolvidos no latrocínio passaram por audiência de custódia na manhã desta sexta-feira (24/1), enquanto estavam detidos no Complexo da Polícia Civil. A Justiça transformou a prisão em flagrante para preventiva. Permanecerão presos até o julgamento. A Vara da Infância e Juventude não informou a situação do adolescente.
Em 18 de janeiro, Aldenys da Silva, 29 anos, foi encontrado morto às margens da BR-070, próximo a Brazlândia. O suspeito do crime, um jovem de 19 anos, continuava foragido até o fechamento desta edição. Em 13 de outubro do ano passado, Henrique Fabiano Dias, 25, foi estrangulado por cinco adolescentes, com idades entre 14 e 17 anos. O quinteto foi apreendido pelo ato análogo ao crime de latrocínio na madrugada do crime, no Guará, com o carro da vítima. Em 11 de outubro, Tiego Cavalcante, 28, morreu com um tiro no rosto, em uma estrada de chão, em Samambaia Sul. O veículo dele foi encontrado perto da Feira Permanente de Samambaia Norte. Ninguém foi identificado ou preso pelo crime.
O Correio entrou em contato com as empresas do sistema de transporte por aplicativos. Em nota oficial, a Uber respondeu que a segurança dos profissionais parceiros é prioridade. “Estamos sempre buscando, por meio da tecnologia, fazer da plataforma a mais segura possível, de uma forma escalável. Hoje, uma viagem pelo aplicativo inclui diversas ferramentas de segurança antes, durante e depois de cada viagem”, alegou o texto.
A empresa explicou que o aplicativo “exige do usuário que quiser pagar somente em dinheiro que insira o CPF e a data de nascimento, dados que são checados na base de dados do Serasa. Desde o ano passado tanto o aplicativo do usuário quanto dos motoristas parceiros foram atualizados com o lançamento do botão Recursos de Segurança. O recurso oferece a opção de ligar para a polícia em situações de risco ou emergência diretamente do app. Além disso, a plataforma reúne todas as informações mais importantes do assunto na Central de Segurança.”
A Uber acrescentou que um novo recurso visando a segurança do motorista chegará ao Brasil no primeiro semestre deste ano. “Com o objetivo de prevenir que pessoas mal-intencionadas usem o aplicativo, a Uber começa a implementar um projeto-piloto do Doc Scan no Chile. Por meio dele, usuários que não adicionarem meios de pagamento digitais no cadastro ou antes de realizar uma viagem serão solicitados a submeter um documento de identificação, que terá dados e autenticidade verificados”, informou.