
Às vésperas da abertura oficial da 30ª Conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudanças climáticas, a COP30, cujos debates começam amanhã em Belém, a tragédia no Paraná acende novo alerta sobre a urgência para evitar o aquecimento global, reduzir os impactos das forças da natureza, principalmente, sobre as populações mais vulneráveis.
Na noite de sexta-feira, um tornado de 250 quilômetros por hora, conforme dados do Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná (Simepar), quase varreu do mapa a cidade de Rio Bonito do Iguaçu, no centro-sul do estado sulista. O saldo do evento climático é de, pelo menos, seis mortos — um deles no município vizinho de Guarapuava — e 750 feridos atendidos em unidades de Saúde de vários municípios, conforme dados do governo paranaense.
Rio Bonito do Iguaçu fica a cerca de 400 quilômetros de Curitiba e abriga 13,9 mil habitantes, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Censo de 2022. A Defesa Civil paranaense estima que até 90% da área urbana da cidade foram atingidas e cerca de 11 mil moradores, afetados.
O desastre no interior do Paraná provocou comoção nacional e mobilizou o governo federal. O governador Ratinho Júnior (PSD) decretou estado de calamidade pública e três dias de luto. Em edição extra do Diário Oficial da União (DOU), o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MDR) reconheceu, o estado de calamidade na cidade de Rio Bonito do Iguaçu, de maneira sumária, "para garantir resposta rápida e efetiva à população dos municípios paranaenses atingidos por um tornado e chuvas fortes".
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prestou solidariedade às vítimas nas redes sociais e informou que enviou uma equipe liderada pela ministra Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), composta pelos ministérios da Saúde e da Integração e Desenvolvimento Regional, para a região.
Além disso, o presidente informou que técnicos da Defesa Civil Nacional especializados em ajuda humanitária e reconstrução foram para as cidades afetadas, assim como profissionais da Força Nacional do Sistema Único de Saúde (SUS) prestarão auxílio à população e às equipes do governo paranaense envolvidas no resgate e no auxílio às vítimas. "Seguiremos apoiando a população paranaense. E prestando todo o auxílio que for necessário", escreveu.
O chefe do Executivo viaja, hoje, para a Colômbia, onde participaria da reunião de cúpula da Comunidade de Estados Latino-americanos e Caribenhos (Celac), e deve retornar ainda hoje.
A ministra Gleisi Hoffmann informou que o governo trabalha para agilizar a liberação de recursos emergenciais, inclusive, com medidas que envolvem o saque do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e benefícios do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) para as famílias afetadas pelo tornado. "Estamos coordenando esforços com o governo do estado e as prefeituras para restabelecer o básico: alimentação, abrigo e reconstrução das casas", afirmou a ministra, que é deputada federal do PT pelo Paraná. "Nossa prioridade é reconstruir o que foi destruído e garantir que ninguém fique desamparado", declarou.
Em nota divulgada ontem, o Ministério da Previdência Social e o INSS anunciaram que vão antecipar o pagamento dos benefícios sociais aos beneficiários das áreas atingidas.
Anna Cárcamo, especialista em Política Climática do Greenpeace Brasil, foi taxativa sobre a necessidade de avanços nas negociações da COP30 que começam amanhã. "Os impactos devastadores do ciclone no Paraná destacam a urgência de combater a emergência climática e de financiar ações de adaptação climática para reduzir os seus impactos, especialmente nas populações mais vulnerabilizadas", destacou, em entrevista ao Correio. "Também é preciso ampliar o financiamento para responder às perdas e danos, para ajudar a reparar e amparar as vítimas. A COP 30 deve entregar avanços nessas frentes, não há mais tempo a perder", acrescentou.
O cenário em Rio Bonito do Iguaçu era de guerra. Classificado de categoria F3 na escala Fujita de avaliação da intensidade que vai até F5, o tornado provocou destruição generalizada, com destelhamentos, quedas de árvores e postes, tombamentos de veículos, colapso de estruturas e interrupção no fornecimento de energia e água e destruição de casas de alvenaria.
Conforme dados do governo paranaense, além de Rio Bonito do Iguaçu e Guarapuava, os ventos provocaram estragos em Candói e Laranjeiras do Sul. A previsão é de que hoje novas equipes federais sejam enviadas para somar esforços no Paraná.
As redes elétrica e viária também foram severamente danificadas, dificultando o acesso às áreas mais atingidas. Os desabrigados estão sendo encaminhados para abrigos montados em Laranjeiras do Sul, município vizinho, com transporte disponibilizado pelas prefeituras locais. Mais de 30 ambulâncias da 5ª e da 7ª Regionais de Saúde foram disponibilizadas para atendimento da região, com mais de 100 profissionais de saúde e voluntários envolvidos.
Um dos hospitais de Laranjeiras do Sul já fez 448 atendimentos, incluindo cirurgias de ortopedia e uma geral. E 52 pacientes dessa unidade foram transferidos para unidades de maior porte, em Guarapuava e em Cascavel. Em outra unidade hospitalar, foram 136 atendimentos, incluindo de crianças e gestantes, além da realização de cinco procedimentos cirúrgicos. Prefeituras de cidades vizinhas estão enviando mantimentos, ambulâncias, profissionais de saúde e bombeiros, além de pessoas voluntárias que se deslocam a todo momento para ajudar às vítimas e na retirada dos escombros.
Em nova carta à comunidade internacional, o presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, reforçou a urgência da cooperação e convidando os atores a transformarem as lacunas climáticas globais em alavancas de transformação. O texto destacou o desafio crucial de manter vivo o objetivo de 1,5°C, por meio da aceleração da implementação e do reforço da cooperação internacional.
"O desafio que se coloca não é apenas identificar o que falta, mas mobilizar o que impulsiona — converter os deficits de ambição, financiamento e tecnologia em forças de aceleração", escreveu o embaixador Corrêa do Lago no documento. O diplomata fez um apelo claro na condição de presidente da COP 30 ao defender que acelerar a implementação deve ser a nova medida de ambição. "Da energia limpa à restauração florestal, da mitigação do metano à infraestrutura digital, o mundo deve ampliar suas ações com rapidez e equidade."
A carta ainda reafirmou que o Acordo de Paris está funcionando e, após a conclusão do livro de regras na COP29, indicou que "a COP30 será a primeira conferência em que todo o ciclo de políticas do Acordo de Paris estará em operação".