A dengue gerou impacto sem precedentes no sistema de saúde pública do Distrito Federal no início desse ano, contabilizando 253.185 casos prováveis em residentes do DF apenas nos quatro primeiros meses do ano e provocando forte reflexo na rede pública. Em todo o ano de 2024, foram registrados mais de 400 mil casos, segundo a Secretaria de Saúde.
A informação foi divulgada em reunião realizada pela Comissão de Fiscalização, Governança, Transparência e Controle (CFGTC) na Câmara Legislativa nesta quinta-feira (3) para apresentação do Relatório de Atividades Quadrimestral da Secretaria de Saúde do DF referente ao 1º quadrimestre de 2024. Esse reflexo se vê no aumento de 134,93% quanto ao número de procedimentos ambulatoriais, quando comparados aos dados do mesmo período de 2023. Foram mais de 160 mil procedimentos diagnósticos (+91,2%). E mais de 457 mil atendimentos em dengue no 1º quadrimestre. Neste sentido, a reunião serviu para consolidar os dados e projetar o que está sendo planejado para o próximo ano.
A presidente da CFGTC, deputada Paula Belmonte (Cidadania), questionou os representantes da Secretaria de Saúde do Distrito Federal sobre o assunto. “Tivemos mais de 400 mortes em relação à dengue, infelizmente, e gostaria que vocês falassem sobre a vacinação, que as pessoas não conseguiram ter acesso, e sobre quais as ações para o futuro”, indagou Belmonte.
O deputado Gabriel Magno (PT), presidente da Comissão de Educação, Saúde e Cultura (CESC), também inquiriu sobre o assunto. “Nas ações de promoção e prevenção há um acréscimo de 8%. Mesmo que esse segundo quadrimestre, seja o principal para essa prevenção, pergunto se esses 8% dariam conta ou não de evitar [o que vem] para 2025”, perguntou.
O subsecretário de Vigilância à Saúde, Fabiano dos Anjos, explicou que “por diversos anos, havia a circulação do sorotipo 1 da dengue e houve a inversão para o sorotipo 2 no fim do ano passado e isso culminou com a maior epidemia de dengue da história do país”. Ele ainda ressaltou que a orientação para vacinar a população de dez a 14 anos vem do Ministério da Saúde e ainda continua. “A vacina ainda está disponível e nosso apelo é para que a população procure os postos para se vacinar”, defendeu o subsecretário.
Prevenção e vacinação
Outra iniciativa relevada por Fabiano dos Anjos é a distribuição da Estação Disseminadora de Larvicida (EDL). “Um pote impregnado de larvicida que dissemina [a substância] quando o mosquito pousa nele e leva o larvicida, que para a evolução do mosquito. A estratégia já foi testada na Bahia e Amazônia, agora será implementada junto com o Ministério da Saúde no DF”, explicou o subsecretário.
A secretária de Saúde do Distrito Federal, Lucilene Florêncio de Queiroz, registrou que nesta sexta-feira (4) haverá o lançamento do plano de mobilização pré-temporada de chuvas para enfrentamento à dengue no DF. “Esse plano será apresentado para as escolas e já fizemos o lançamento com as regiões administrativas. Vamos usar um aplicativo eletrônico cedido pela Secretaria de Saúde de Mato Grosso, a borrifação residual, que é o pincelamento das paredes [com larvicida] onde há grande circulação de pessoas e até o uso de drones para monitorar e inclusive colocar o larvicida no ponto onde há um acúmulo de água e não foi possível adentrar”, resumiu a secretária.
Queiroz anunciou ainda que o Distrito Federal receberá os instrumentos necessários para atuar com mosquito geneticamente modificado no combate à dengue. “Nós não teremos ainda a nossa fábrica, mas receberemos o extrato e faremos o cultivo e essa liberação do mosquito geneticamente modificado”, declarou a gestora.
Sobre a vacinação, a secretária disse que “a cobertura vacinal na faixa etária entre dez e 14 anos está na faixa de 33% e na segunda dose cai bastante, tanto que a busca é para termos vacina em dose única quando ela for produzida no país”.
No primeiro quadrimestre foram aplicadas a 1ª dose da vacina contra a dengue em 60.037 pessoas. Vale registrar que a meta é atingir a cobertura de 90% da população nesta faixa etária. Segundo a secretária de Saúde, foram ofertadas 102 mil doses da vacina.
Saúde Mental
A saúde mental também foi assunto bastante abordado durante a reunião. A deputada Paula Belmonte questionou sobre as medidas que estão sendo tomadas para fortalecer o atendimento à saúde mental. “Estive com o presidente do Iges e nos disseram que grande maioria das pessoas que chegam nas UPAs têm problema de saúde mental. Hoje temos uma falta de fortalecimento dos Centro de Atenção Psicossocial (Caps). O que a secretária está pensando para esse fortalecimento?”, questionou a parlamentar. “Enviamos a LOA [projeto da Lei Orçamentária Anual para análise da Câmara Legislativa] e pela primeira vez conseguimos colocar quase R$ 100 milhões de investimento para cinco CAPS. Dois que já começaram a ser construídos e três que já iniciam em 2025. Então, temos aumento de cinco unidades para atendimento em breve”, respondeu Rodrigo Vidal, subsecretário de Planejamento da Secretaria de Saúde do DF.
A secretária Lucilene de Queiroz completou a informação. “Já estão em licitação os do Gama e Recanto das Emas. Os outros serão no Guará, Taguatinga e Ceilândia. Para o momento, oferecemos a ampliação da carga horária para todos os servidores que estão em CAPS e já temos 48 que manifestaram interesse, desses 14 já foram atendidos. E depois tivemos posse de 11 psiquiatras que foram lotados em Caps e no hospital São Vicente”, afirmou Lucilene.
Paula Belmonte também usou dados enviados pela deputada Dayse Amarílio (PSB) sobre a relação entre a população e o número de unidades de CAPS. “Teríamos a necessidade de 40 CPAS I, 19 Caps III e mais 19 Caps álcool e drogas. Percebemos que estamos muito aquém da necessidade da população. E quase 70% da demanda das UPAs é por [atendimento] para doenças mentais e o DF ainda não tomou atitude adequada para responder a população neste sentido. Apesar da boa notícia de estarmos construindo cinco, ainda é muito aquém”, disse Belmonte.
Iges
A reunião ainda abordou assuntos relativos ao Instituto de Gestão de Estratégica de Saúde (Iges-DF), especialmente, devido às recentes investigações e operações policiais relativas ao instituto. A secretária de Saúde adiantou que o órgão está criando superintendências específicas para acompanhamento de contratos como os do Iges e do Instituto de Cardiologia e Hospital da Criança (HCB).
Queiroz adiantou ainda que o Distrito Federal será piloto na avaliação da atenção especializada. A ação será iniciada com cinco hospitais em um projeto para avaliar a qualidade do serviço e segurança do paciente. Estão incluídos o HCB, Hospital Universitário de Brasília, além de unidades que estão sob a gestão do Iges, como o Hospital de Base. “Estaremos com um avaliador do Ministério da Saúde neste processo e isso é um processo de transparência, quando estaremos sendo avaliados. O dinheiro público é complexo de usar e nos [esse projeto] dá tranquilidade do monitoramento no uso desse recurso”, afirmou a secretária.
Servidores
Ainda durante a reunião, a Secretaria de Saúde informou que tem 31.965 servidores, sendo que atualmente 30.297 estão em efetivo exercício. Desse total, 28.538 são concursados. As carreiras mais numerosas são as de técnico de enfermagem (8.845), de assistência pública em saúde (6.055), de médico (4.550), de enfermeiro (4.158), especialista em saúde (3.424) e de agente de vigilância ambiental (AVAS) e agente comunitário de saúde (ACS), que somam 1.542 servidores. No 1º quadrimestre foram realizadas 961 nomeações, sendo 348 médicos, 184 técnicos de enfermagem, 158 AVAS, 156 enfermeiros e 115 ACS.
Segundo a secretária, a intenção é nomear mais. “Houve pedido de suplementação orçamentária e com isso solicitamos a nomeação de 400 AVAS. Precisamos chamar enfermeiros generalistas. Chamamos os agentes comunitários que estavam na LDO e agora teremos a alteração da LDO e da LOA para que a gente faça o chamado. Já zeramos o cadastro de reserva de algumas especialidades médicas como pediatria, anestesiologia, emergencista e médico de família e comunidade, por exemplo. Há outras especialidades, como ortopedia, cirurgia geral e obstetrícia, que ainda temos cadastro reserva e temos feito a tratativa com a Secretaria de Economia”, informou a secretária.
O deputado Gabriel Magno fez questionamentos sobre as previsões de nomeações e projeção para o próximo ano. “Na LDO de 2024, há previsão de 1.725 servidores da saúde, subdimensionado em nossa opinião, e um pouco corrigido na LDO para 2025 a previsão é de 9.088 nomeações entre todas as carreiras. Mas quero destacar a previsão de 1.350 AVAS e ACS, que são muito importantes na prevenção e combate à dengue”, indagou o deputado, questionando qual o planejamento para esses profissionais específicos.
Na resposta, o representante da Secretaria de Saúde disse que até hoje foram realizadas 1.502 nomeações e que “a LDO desse ano foi atualizada [com a previsão de] 8 mil nomeações, sendo nomeados pelo menos 500 profissionais de AVAS e ACS ainda esse ano”.
Já o presidente do Conselho de Saúde do Distrito Federal, Domingos de Brito Filho, perguntou o que a secretaria planeja fazer para combater o absenteísmo. “Chegamos ao ponto de ter 13,9% em ACS, 11,4% de enfermeiros e 10,72% de técnicos. Por que não trazer de volta essa força?”, perguntou Domingos.
A coordenadora Mabelle Veronília Roque, da subsecretaria de Gestão de Pessoas da Secretaria de Saúde, disse que são realizadas várias ações paralelas. “Tem um programa de qualidade de vida no trabalho que atua diretamente no acolhimento do servidor afastado quando ele retorna. Temos ainda previsão de efetivar em breve o concurso de remoção”, registrou a coordenadora.
Execução orçamentária
Foi autorizado pela LOA a execução de R$ 10,1 bilhões, sendo 7,5% de recursos da União, 28,9% do Distrito Federal e 63,6% do Fundo Constitucional do Distrito Federal. Até o fim de abril de 2024, foram empenhados R$ 4,4 bilhões e liquidados R$ 3,7 bilhões. Do total de recursos empenhados, aproximadamente 40% são para pagamento de pessoal.
Quando é considerada a execução orçamentária por grupo de atenção, já foram empenhadas 69,75% do recurso autorizado para atenção hospitalar e ambulatorial. Já para a farmacêutica, estão empenhados quase 75% do recurso autorizado para o 1º quadrimestre.
Gabriel Magno defendeu a ampliação do investimento em saúde. “O SUS é barato e devolve muito para a sociedade porque se a gente fizer a conta do orçamento de R$ 10 bilhões e dividir pela população, chega em R$ 237 mensal por pessoa. Isso é metade do que o próprio GDF cobra de seus servidores no seu plano de saúde e o SUS é muito maior do que qualquer plano de saúde pode oferecer. Além disso, há quase R$ 9 bilhões em benefícios fiscais. E me preocupa porque no orçamento da Saúde, a cada ano, aumentam os contratos de terceirização e diminui o orçamento de manutenção da rede SUS”, destacou Gabriel.
Já a presidente da CFGTC ressaltou a importância desse monitoramento feito pela comissão. “Estamos fazendo esse trabalho na Comissão e vamos continuar para que vocês possam ter cada vez mais esses dados com transparência e utilizando isso para uma boa gestão dos recursos”, defendeu Paula Belmonte.
Atenção primária
Em relação à produção de serviços do sistema público na atenção primária, foram registrados 1,571 milhões de atendimentos individuais realizados, 42% a mais do que no mesmo período do ano anterior. E 2,921 milhões de procedimentos, um acréscimo de 29% sobre o igual período de 2023. O índice de cobertura da atenção primária chegou a 69,7%. A meta é atingir pelo menos 72% na cobertura das equipes de saúde da família. Vale registrar que a divulgação de dados do senso, alterando a população do DF, deve mudar um pouco esses dados.
Na atenção especializada hospitalar houve incremento de 11%, resultando em 81.846 internações. Entre os principais grupos, destaca-se o de procedimentos clínicos com quase 57 mil realizados. Neste, o principal é relacionado à dengue (12,1%). Foram realizados pouco mais de 24 mil procedimentos cirúrgicos e 615 transplantes.
Aqui, a deputada Paula Belmonte perguntou como está a fila para cirurgias eletivas atualmente. “Havia 30.731 pacientes na fila de cirurgias. No primeiro quadrimestre, 15.795 cirurgias eletivas só nesse período e a fila continua. Isso mostra que não estamos tendo a capacidade de atender o que entra e reduzir a fila. Fizemos um levantamento e encontramos mais de 2.800 pacientes que já fizeram a cirurgia na nossa rede, uma redução que quase 10% nesta fila de 30 mil”, disse Rodrigo Vidal.
Internações
A Secretaria de Saúde divulgou que foram 81.846 internações realizadas no período. As causadas por gravidez, parto e puerpério representaram 20,9% (17.099), doenças infecciosas e parasitárias, onde está a dengue, foram 13,5% (11.047) e provocadas por lesões, envenenamento e causas externas atingiram 9,1% (7.408).
Houve 15.470 internações de pacientes provenientes da RIDE no sistema público de saúde do DF, sendo que foram 14.133 delas para urgência e 1.337 para o sistema eletivo. Neste grupo de atendimentos de pacientes da RIDE, as internações foram de pediatria (31%), obstetrícia (34%), clínica médica (22%) e cirurgia (20%).
Natalidade
Os dados mostram que foram 11.133 nascidos vivos no DF dentro do primeiro quadrimestre de 2024. Na rede pública, foram 54,5% de parto normal, sendo que a meta é de 45%. Segundo a secretária Lucilene de Queiroz, estão sendo adotadas medidas para aumentar ainda mais esse percentual de partos naturais. “Hoje temos na secretaria a carreira de enfermeiro obstetra e também a presença de doulas. Temos apenas a maternidade Casa de Parto São Sebastião e agora, dentro do Programa de Aceleração do Crescimento [do governo federal], o DF foi contemplado com um Centro de Parto Normal na Ceilândia”.
A deputada Paula Belmonte disse que o número de cesarianas ainda é alto. “Ainda é muito alto, quase 50%, e isso gera impacto [no sistema]. Tem mais tempo no hospital, tirando leitos de pessoas que estão precisando [para outra finalidade]. Além disso, também reflete a falta de contratação de enfermeiros obstetras”, declarou a deputada.
Mortalidade
Houve 5.413 óbitos no DF de janeiro a abril de 2024, um aumento de 20,4%. As doenças do aparelho circulatório representaram 22,4%, as neoplasias (câncer), 18,8%, e doenças infecciosas e parasitárias fecham as três principais causas de morte chegando a 11,45%. Nesta última, foi registrado aumento de 94% na comparação com o mesmo período de 2023. A explicação dada foi relacionada à explosão no número de casos de dengue.
Francisco Espínola - Agência CLDF
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