Segurança PL Antifaccção
Pressionado, relator apresenta 3ª versão do PL Antifaccção
Derrite recua e altera parecer. Retira mudanças na lei antiterrorismo e pontos polêmicos sobre PF. Texto deve ser votado hoje
12/11/2025 10h25
Por: Samuel Barbosa Fonte: Notícia Certa

Após receber uma série de críticas, o relator do Projeto Antifacção na Câmara, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), entregou ontem à noite a terceira versão do seu parecer, desta vez, sem retirar prerrogativas da Polícia Federal e sem alterações na lei antiterrorismo. Batizado de Projeto de Lei do Marco Legal do Combate ao Crime Organizado, o texto deve ser votado hoje.

A apreciação do relatório estava previsto para ontem, mas foi adiado diante de questionamentos levantados pelo governo e por partidos sobre trechos do texto que tratavam das competências da Polícia Federal, que, entre outros pontos, só poderia entrar em investigações se fosse acionada por governadores. Também havia impasse a respeito da inclusão de pontos inspirados na antiga Lei Antiterrorismo.

Em entrevista coletiva Derrite negou que haja impasse com o governo e afirmou que a polêmica decorreu de "um equívoco de interpretação". O parlamentar ressaltou que o novo marco não retira prerrogativas da Polícia Federal e que busca apenas atualizar a legislação para o combate mais efetivo ao crime organizado.

"O projeto não enfraquece a Polícia Federal nem retira suas competências. Muito pelo contrário: ele fortalece a integração entre as forças de segurança e melhora a capacidade de enfrentamento às facções", sustentou Derrite. Segundo ele, o debate sobre o tema é natural, mas não deve ser usado de forma política.

O presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), afirmou que a decisão de adiar a votação visa garantir um texto de consenso. "O combate ao crime organizado é prioridade da Casa. O que queremos é uma legislação moderna, que reforce a soberania e preserve a autonomia das instituições", declarou.

Derrite também explicou que o novo texto excluiu o trecho que mencionava a Lei Antiterrorismo (13.260/2016), após críticas da esquerda. O relator ressaltou que o projeto trata exclusivamente de crime organizado, e não de terrorismo. "Retiramos o trecho para evitar interpretações equivocadas. Não há relação entre os dois temas", afirmou.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi um dos que dispararam críticas ao texto anterior de Derrite. Na visão dele, que corrobora com a da Receita Federal, a aprovação do texto como estava inviabilizaria a Operação Cadeia de Carbono e outras medidas como essa, que visam atuar contra o crime organizado no país.

"A Receita está muito incomodada com o relatório porque ela está perdendo prerrogativas tanto quanto a Polícia Federal. Então, você está esvaziando os órgãos federais de combate ao crime organizado no país, na minha opinião para fortalecer quem? O próprio crime organizado. É muito sério, muito grave", disse ontem o ministro, a jornalistas.

Com o adiamento, a expectativa é de que o novo texto seja votado nesta quarta-feira, após novas rodadas de negociação entre as bancadas. O parecer cria um sistema nacional para integração de dados, articulação de políticas públicas e compartilhamento de recursos entre União, estados e municípios no combate às facções criminosas.

Em coletiva de imprensa após o pronunciamento de Derrite e Motta, os líderes do PT e do Governo na Câmara, Lindbergh Farias (RJ) e José Guimarães (CE), parabenizaram o relator e afirmaram estar "felizes" com a exclusão da proposta antiterrorismo. Também ressaltaram que a matéria volta, agora, à proposta inicial do governo, de aumentar penas contra o crime organizado.

"Eu considero uma vitória muito grande, uma vitória da racionalidade, a gente já excluir essa questão do terrorismo. Se você for ver, era isso que argumentava o governo. Bastava ter ido no projeto original do governo, que era justamente isso: um novo tipo penal, no caso, a facção. Se querem mudar o nome, tudo bem, mas era justamente isso que a gente defendia", frisou Guimarães.

Já Lindbergh destacou que incluir terrorismo na proposta abriria caminho para um ataque à soberania nacional e traria prejuízo à economia. "Então é uma vitória da mobilização da sociedade, importante o recuo", pontuou.

Do outro lado, o líder do PL, deputado Sóstenes Cavalcante (RJ), disse que a proposta é "deles" (da oposição) e que a sigla não abrirá mão de seu projeto antiterrorismo, que visa enquadrar criminosos armados e organizados como terroristas. Para ele, o texto do governo, ainda que preveja aumento de penas e novos tipos penais, não resolve o problema estrutural da segurança pública no país.

Cavalcante também criticou a tentativa de vincular o projeto do governo à Lei Antiterrorismo (13.260/2016). "Se o relator Derrite retirar trechos relacionados ao terrorismo, o PL manterá seu projeto separado. Não podemos aceitar que o governo tente enganar a população com uma proposta superficial, que parece endurecer penas, mas não resolve o problema de segurança", afirmou.

Ele também destacou que o partido só tomará posição oficial sobre a votação quando tiver acesso ao relatório final. Entretanto, adiantou que a tendência é apoiar medidas que endureçam a punição para crimes graves, mas que a equiparação ao terrorismo será prioridade absoluta do PL.

"O governo pode votar o projeto dele, mas o nosso compromisso é com a segurança do cidadão. Só um enquadramento adequado de criminosos armados e organizados como terroristas permitirá o uso de inteligência internacional e bloqueio de recursos, além de aumentar o custo da criminalidade", concluiu.

Governadores debatem em Brasília 

A segurança pública será tema do almoço de, hoje, da Frente Parlamentar pelo Livre Mercado (FPLM) com três governadores e a vice-governadora do Distrito Federal, Celina Leão. Confirmaram presença Romeu Zema, de Minas Gerais; Ronaldo Caiado, de Goiás; e Jorginho Mello, de Santa Catarina.

O encontro tem como objetivo discutir prioridades legislativas ligadas à segurança pública, e deve reunir também parlamentares engajados na pauta. A reunião ocorre após o presidente da Câmara, Hugo Motta, anunciar a tramitação do PL Antifacção.

A reunião é vista como uma tentativa de articular posições conjuntas e fortalecer a atuação política dos governadores em torno do combate ao crime organizado e da agenda legislativa de segurança pública.

A expectativa é de que, após o almoço, as lideranças estaduais encaminhem sugestões ao Congresso para subsidiar a tramitação do PL Antifacção.

Ontem, Celina Leão defendeu que o tema ultrapassa fronteiras partidárias e precisa envolver toda a sociedade. "A segurança pública é um tema de toda a sociedade, principalmente das mulheres. São mães, filhas, trabalhadoras que dependem da segurança pública para transitar. Esse debate é emergencial", disse, em entrevista coletiva após participar do evento Lide.

A vice-governadora também mencionou a recente escalada de violência no Rio de Janeiro como um alerta nacional. "O que aconteceu no Rio foi a demonstração de um caos que já vivia o estado. Se não forem tomadas providências, isso se torna um problema de soberania nacional", afirmou.

Ela também se manifestou contrária a retirada de prerrogativas da Polícia Federal. "Não podemos politizar um tema tão sério. A Polícia Federal tem suas prerrogativas, e elas devem ser respeitadas. O que precisamos é de cooperação entre os governos federal e estaduais", ressaltou. Para a vice-governadora, a população "está mais preocupada com o resultado do que com quem vai agir — se o governo federal ou estadual".

A necessidade de ampliar a participação feminina no debate sobre segurança também foi destacada por Celina. "Talvez tenhamos poucas governadoras hoje, mas o tema mobiliza muitas mulheres. Elas precisam ser protagonistas nas decisões que envolvem segurança pública", frisou.

Antes de novo texto, parlamentares enfatizaram a necessidade de correções para evitar prejuízos à Polícia Federal. "Eu sou um defensor ferrenho da Polícia Federal. Há essa preocupação, não apenas de parlamentares, mas também do relator e do próprio presidente da Câmara, para que a PF não se sinta prejudicada. Eu não concordo que a PF tenha que ser acionada por um governador. Amanhã, podemos ter um que patrocine o crime organizado, e isso seria um desastre", afirmou o deputado Sargento Fahur (PSD-PR).